25.7.06

Santa Teresa dos Detalhes > contracapa

[ continuação do Prefácio Perambulante...]

Posfácio Estabilizante

Faço, então, alguns comentários a cada foto, na ordem em que foram feitas, sobre como as coisas se desenvolveram. Sem pretensão de ensinar fotografia, muito menos ganhar concursos...
Comentar me parece bom. Sempre me interessei pelo lado não visível da nossa produção de fotógrafos. Pelo menos, sempre dá boas histórias para contar aos amigos... Onde o fotógrafo estava, como chegou lá, o que pretendia, quais foram os obstáculos, quanto de reflexo, quanto de produção. E outras questões embutidas ou pré-embutidas ou pós-observadas em cada foto... Para muitas pessoas isso tem algum fascínio, e não há porque fazer mistério. Não ser misterioso é o grande mistério: quantas casualidades já ganharam prêmios?... É mais um tempero acrescido ao sabor da imagem.
O texto
Talvez por ter sido a imprensa minha grande escola (ou será que por isso escolhi a imprensa?...), o fato é que imagem e texto são pra mim um casamento natural. Não que não curta a foto por si só, mas, se há uma legenda, uma informação geográfica, uma data (ou um poema, pra não ser factual e objetivo demais), é como se o presente viesse bem embrulhado, como se uma oportunidade não tivesse sido perdida...
E, aos poucos, das imagens, começaram a brotar palavras. E eu, a me empurrar no sentido de segurá-las e, como que, fixá-las, colá-las de volta, às imagens.
A imagem me dá o rumo, o caminho vai sendo pavimentado de palavras... A tal ponto, que não me vejo mais uma coisa que outra, fotógrafo ou comentarista (ou coisa que o valha), mas, um indisciplinado ser multidisciplinar. Porque um é necessidade imediata do outro. E ainda outros...
Daí esses textos, que é como me dou o direito de chamar, que, também como exercício de reverência à forma, contive no essencial do haicai, com suas contagens de sílabas e sua falsa falta de naturalidade... O que não deixa de ser também uma espécie de instantâneo fotográfico de uma idéia ou sentimento. É como se eu tivesse escolhido usar um certo tipo de lente...
E por baixo disso tudo, tão fundo como me é possível, uma miscelânea de emoções, que vão desde a memória da história sugerida, impregnada nas pedras e nas curvas de Santa Teresa, até o companheirismo de amigos (coadjuvantes em várias fotos ou idéias). E ainda o contato com figuras inesperadas de pessoas que surgem das calçadas ou o admirar-se com as luzes, os reflexos e os brilhos do dia ou da noite, nas ladeiras e nos trilhos. E, mais fundo ainda, questões antigas, atávicas ou adquiridas, como todos temos, que desgastam etc, mas ajudam...
Nada pretensioso. Não há fotos transcendentes nem textos inesquecíveis. Trata-se, apenas, de uma tímida ode às minúcias de Santa Teresa, esse lugar incomum, até mesmo para o Rio, que já é uma cidade bastante incomum... Não é demais que uma cidade dita Maravilhosa seja pontilhada de pequenas maravilhas, como as que surpreendem o carioca incauto, caso ele, um dia, ponha uma bermuda de gringo e empunhe o cetro fotográfico de turista casual.
Isso é coisa que Santa Teresa proporciona. Acho que até seus moradores se sentem meio turistas e olham à sua volta, vez por outra, a cada dia, como se dentro de um cotidiano viajante, eles mesmos personagens de suas próprias paisagens, enquanto passam os bondes, mudam as luzes e envelhecem as casas...
Foi com este prazer que fiz estas fotos, e tal... E é com o maior prazer que as divido, nesse pacote de sentimentos, com todos que pisarem nesse estribo, balançarem nessas curvas, se agarrarem aos balaústres...
Os haicais (no formato 5-7-5 sílabas) são pequenas fotografias das fotografias (e nem é minha esta boa definição), mas só quando lidos... Porque, ao serem feitos, exigem muito diferente esforço. Alguns até saem tão instantâneos e quentinhos, que só há que pegá-los com cuidado e surpresa. Já a maioria demanda trabalho até enjoado, um tal de escarafunchar a imagem, penteá-la em suas várias direções...
Mas é um direito de todos, como é um direito fazer a foto (ou ambos, no caso). E’ um exercício de síntese (outra coisa também não é a foto), que tem a vantagem de provocar um novo debruçar, uma nova convivência com o momento e a situação (e os sentimentos do momento e da situação) da foto.
Parece bom isso, numa época em que tudo é tão rapidamente feito e consumido, até mesmo o que cada um ousa produzir, autônomo. Isso de ter uma chance de voltar ao quando e onde surgiu a imagem e coar o que haja ali de palavra...
É um pouco sentimental, portanto, nada útil ou necessário à compreensão do que é visto. Mas, podem, às vezes felizmente, fazer até algum (ou mais) sentido(s).
Seja como for, nenhuma forma de reflexão (ouso propor...) deve ser desprezada, ao menos por quem a faz.
E que seja apreciável...

Aguinaldo Araújo Ramos

Setembro de 1997, revisado em Julho de 2006.



A publicação deste material na forma de livri corresponde a um considerável esforço do autor para publicá-lo como livro, à época.
Dados os custos de impressão de um livro com fotografias, tentou conseguir patrocínio, em especial junto aos próprios patrocinadores do Festival (até apelando a Santa Clara que clareasse certas mentes...), mas não resultou.
O próprio ato de receber o prêmio de “Melhor Ensaio” do Rally foi praticamente clandestino: faltou luz na hora, no Museu Benjamin Constant, e o prêmio, uma câmera Nikon (o que, ainda bem, não era pouco...), foi entregue na mais completa escuridão!...

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Uma aula de fotografia, Aguinaldo, texto e fotos. E eu aí aprendendo...
Romildo Guerrante

10:52 AM  
Anonymous Anônimo said...

Parabéns,obrigado pelos momentos prazerosos que você me proporcionou compartilhando este livri,e também os outros. Só me fez admirá-lo e conhece-lo ainda mais. Torço por você.Beijos Márcia Hortência

8:01 PM  

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